Resenha: O apanhador no campo de centeio, J. D. Salinger, Editora do Autor

Italo Calvino, famoso escritor e crítico literário italiano, em seu livro "Por que ler os clássicos?", definiu os clássicos da seguinte forma:

1. Os clássicos são aqueles livros sobre os quais você costuma ouvir pessoas dizendo: “estou relendo”, e nunca “estou lendo”.

2. Um clássico é um livro que a cada releitura oferece uma sensação de descoberta como na primeira leitura.

3. Um clássico é um livro que, mesmo quando lemos pela primeira vez, dá a sensação de que estamos relendo algo familiar.

4. Um clássico é um livro que nunca esgota tudo o que tem a dizer a seus leitores.

5. Clássicos são livros que, quanto mais pensamos que conhecemos através de boatos, mais original, inesperado, e inovador o achamos quando nós realmente os lemos.

E eu concordo com ele em tudo. No caso de "O apanhador no campo de centeio", (clássico indiscutível da Literatura Mundial, do aclamado J. D. Salinger), eu pude experimentar o que os tópicos 3, 4 e 5 acima dizem. Apesar de ter sido escrito em 1951, não envelheceu em relação aos temas fundamentais tratados ali. Continua moderno, interessante, surpreendente, e tem muito a oferecer a qualquer um que o leia. Na época foi considerado um livro subversivo para os jovens, e muitos até hoje o consideram "uma inspiração para psicóticos". Segundo informações da Wikipedia, o assassino de John Lennon, Mark David Chapman, estava carregando consigo um exemplar de O Apanhador na hora em que cometeu o crime e afirmou ter retirado dele a inspiração para o assassinato. Para mim o fato da obra ser controversa é mais um motivo para o lermos.
Sinopse: À espera no centeio (O Apanhador no Campo de Centeio na edição brasileira) narra um fim-de-semana na vida de Holden Caulfield, jovem de 16 anos vindo de uma família abastada de Nova York. Holden, estudante de um reputado internato para rapazes, volta para casa mais cedo no inverno depois de ter recebido más notas em quase todas as matérias e ter sido expulso. No regresso a casa, decide fazer um périplo adiando assim o confronto com a família. Holden vai refletindo sobre a sua curta vida, repassa sua peculiar visão de mundo e tenta definir alguma diretriz para seu futuro. Antes de enfrentar os pais, procura algumas pessoas importantes para si (um professor, uma antiga namorada, a sua irmãzinha) e tenta explicar-lhes a confusão que passa pela sua cabeça. Foi este livro que criou a cultura-jovem, pois na época em que foi escrito, a adolescência era apenas considerada uma passagem entre a juventude e a fase adulta, que não tinha importância. Mas esse livro mostrou o valor da adolescência, mostrando como os adolescentes pensam.
Fonte: http://www.skoob.com.br/livro/114-o_apanhador_no_campo_de_centeio

Holden Caufield é de longe o personagem adolescente mais interessante que já vi, seja no Cinema ou na Literatura. Tem personalidade forte, opiniões que vão contra o senso comum - o que podemos chamar de 'politicamente incorretas'. E o livro narra uma fase de crise na vida desse jovem, que se sente um peixe fora d'água no mundo (como qualquer adolescente, em qualquer época da História) e vai em busca de respostas, com desconhecidos ou pessoas que preza. 

Penso que o que torna esse livro tão fenomenal é a personalidade única de Caufield. Ele é um personagem quase shakesperiano: repleto de dúvidas, de dramas, de questionamentos profundos e sagazes. Um jovem cuja psique amadureceu mais rápido do que seu corpo. E jovens assim são, até hoje, subestimados e mal compreendidos pelos adultos que os cercam (falo por experiência própria). Muitos prosseguem a vida e conseguem superar isso. Mas outros entram em uma espiral decrescente de autodestruição, e simplesmente surtam. Caufield começa a surtar no livro, passo a passo rumo a um lugar desconhecido e perigoso em sua mente. 

Minha experiência de leitura foi MARAVILHOSA. Não conseguia parar de lê-lo. Devorei mesmo, e saboreei cada página, cada frase brilhante do personagem principal. Esse é um daqueles livros que te fazem chegar à conclusão simples e óbvia de que "clássicos são clássicos e ponto". Você nunca é a mesma pessoa depois da leitura de um clássico. Ele muda você. Você não pode consumir um Salinger, um Orwell, um Dostóievski. Eles consomem você. E isso é fabuloso. Quem nunca leu um livro assim não sabe o quanto está perdendo. Novos autores merecem nossa atenção - quando seus trabalhos são de qualidade, claro. Mas os autores clássicos merecem nosso respeito, diria até devoção. 

Abaixo listo alguns parágrafos que marquei no Kobo, todos falas de Caufield (algumas bem divertidas):

"Dinheiro é uma droga. Acaba sempre fazendo a gente se sentir triste pra burro."

"Ninguém consegue parar um professor quando eles resolvem fazer alguma coisa".

"Se uma garota está bonita quando chega, qual é o sujeito que vai se importar por causa do atraso? Ninguém se importa".

"De cada dez pessoas que choram de se acabar com alguma cretinice no cinema, nove são, no fundo, uns bons sacanas. Fora de brincadeira".

"Bom mesmo é o livro que quando a gente acaba de ler fica querendo ser um grande amigo do autor, para se poder telefonar para ele toda vez que der vontade".

"Se a gente faz uma coisa bem demais, aí, depois de algum tempo, se não tiver muito cuidado, começa a se exibir. E aí a gente deixa de ser bom de verdade."

Eu me apaixonei pelo jeito divertido do personagem se expressar. Suas frases de efeito, "fora de brincadeira" e "pra burro" me fizeram rir ou chorar toda vez que apareceram no texto. Ele é um adolescente charmoso e do tipo que você gostaria de conhecer e ficar conversando por horas. Sua visão de mundo, tão peculiar, é mesmo fascinante. 

É interessante ver o quanto o que equivaleria a um YA, na década de 50, era infinitamente superior aos atuais. Portanto, eu recomendo, aliás, é obrigatório um jovem que curte boa Literatura ler esse livro. Deixe de lado pelo menos por uns dois dias seus autores YA preferidos e saboreie esse clássico. Você, com absoluta certeza, não vai se arrepender.

Nota:


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Observação: Um escritor chamado Fredrik Colting escreveu a continuação de "O Apanhador", chamado "60 anos depois: do outro lado do campo de centeio". Não o li, nem tenho planos de lê-lo, E confesso que não sou fã de continuações escritas por outros autores. 

Comentários

  1. Os clássicos "pregam" em nossa mente, ficam lá por dias a fios e isto é que é bom na leitura. De uns tempos para cá tenho dado preferência aos clássicos, pois acredito que existe o momento certo para eles. Se eu tivesse lido alguns clássicos em outras épocas, talvez não tivesse a mesma compreensão que tenho hoje. Não li O apanhador no campo de centeio, mas sem dúvida a maioria dos clássicos merece atenção.

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    1. Muito interessante sua colocação quanto à época certa de ler os clássicos. Também acredito nisso. Mas também acho que, quanto mais cedo as crianças tiverem contato com clássicos, melhor para seu desenvolvimento e para incutir neles o prazer da leitura.

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